Durante os últimos 90 dias fomos sacudidos pelo furacão das eleições. Sem sombras de dúvida, uma das eleições mais marcantes de nossa história política. Teve de tudo. Acusações de parte a parte, denúncias de escândalos, promessas de campanha, choro de candidatos. A eleição para presidente da República, então, foi um capítulo à parte.
No início, o resultado das pesquisas apontavam para uma vitória folgada de Dilma Rousseff. Alguns institutos chegavam mesmo a dizer que ela venceria no primeiro turno. Não contavam com uma fatalidade: a morte de Eduardo Campos. O trágico acontecimento fez com que Marina Silva desse um salto, ultrapassando Dilma na preferência dos eleitores. Pela primeira vez a representante do Governo se via ameaçada. Perdera o primeiro lugar e, se as coisas não tomassem outro rumo, também a reeleição. Mas esse quadro logo, logo, mudaria. Marina Silva não conseguiria sustentar a preferência dos eleitores. Vítima das metralhadoras de seus adversários e também do conteúdo de seu próprio discurso, o certo é que daí por diante presenciamos uma queda vertiginosa da candidata nas pesquisas de intenção de voto. Dilma, então, reassume a “ponta” da corrida presidencial e Aécio passa a ser o seu adversário direto. Já não havia muita diferença entre ambos. O debate na Rede Globo, no primeiro turno, foi decisivo para que Aécio crescesse nas pesquisas. Era a sua vez de ficar na “pole position”. Veio o segundo turno e também Aécio, como Marina Silva, não conseguiu se manter na preferência do eleitorado. Sua queda, embora não significativa, tratou de mantê-lo sempre em segundo lugar, ligeiramente abaixo de Dilma. Datafolha e Ibope registravam empate técnico entre os dois candidatos que somente foi quebrado próximo ao dia das eleições quando o Ibope, também após o debate na Rede Globo, apontara a vitória de Dilma, ainda que por diferença mínima. Não deu outra. A distância entre a candidata do Governo e Aécio foi de apenas 3% dos votos apurados, equivalente a 3,5 milhões de eleitores aproximadamente.
Esse foi, em resumo, o percurso das eleições presidenciais. Curadas as feridas e recobrados os ânimos, a vez agora é de cuidar deste País que, aliás, já há algum tempo está doente e não apresenta sinais de melhoras. Todos os seus sinais vitais, a exceção da taxa de desemprego – em torno de 5% e ainda comparável a algumas economias avançadas como a Alemanha – não são favoráveis. Apontam para a piora do quadro do paciente já neste ano e nos próximos, se não forem tomadas medidas urgentes. O resultado dos exames realizados projeta um quadro sombrio. E olha que o diagnóstico não está ancorado em cores político-partidárias. Até os estudantes residentes vislumbram esse cenário.
O resultado primário calculado pela Secretaria do Tesouro Nacional é um bom exemplo disso.
Em agosto deste ano o governo central (tesouro nacional + banco central + previdência social) apresentou déficit de 10,4 bilhões de reais. O resultado negativo, entretanto, não foi isolado. Segundo dados da Secretaria do Tesouro Nacional, o desempenho também foi negativo nos meses de fevereiro (3,4 bilhões), maio (11,1 bilhões) e julho (1,9 bilhões). Portanto, há uma tendência para o vermelho no corrente exercício. Essa expectativa se reforça quando comparamos o desempenho deste ano com o de 2013. No ano passado, houve déficit significativo apenas em dois meses do ano: fevereiro (7,15 bilhões) e setembro (10,76 bilhões). Em agosto, o tesouro também amargou um resultado negativo, mas de menor proporção (54,6 milhões).
O resultado primário mede a capacidade de um governo sobreviver apenas com seus próprios recursos (receitas primárias), sem que ele necessite recorrer a empréstimos para financiar as suas despesas (primárias). Além disso, a poupança que é feita mensalmente é aplicada na amortização da dívida pública. Portanto, ainda que pequena, ela é importante para que os empréstimos de longo prazo dos governos sejam reduzidos. No Brasil, a meta de resultado primário é fixada anualmente na lei de diretrizes orçamentárias. Para 2014 ela foi estabelecida em 80,8 bilhões de reais.
Outro fator preocupante é a taxa de juros. Desde novembro do ano passado que a taxa de juros Selic não sai dos dois dígitos. Atualmente ela está em 11%, embora tenha estacionado nesse nível desde maio do corrente ano. O elevado juro numa economia encarece o investimento do setor privado desestimulando a criação de emprego e renda. Conquanto a manutenção de altas taxas de juros seja, muitas vezes, necessário para combater surtos inflacionários – outro fator preocupante no Brasil – ela paulatinamente vai brecando o crescimento econômico, fazendo com que o setor produtivo produza cada vez menos. É como se um paciente definhasse lentamente de inanição. Talvez seja essa a raiz do pífio crescimento do PIB brasileiro que, após bater 7,5% em 2010, caiu significativamente para 2,7% (2011), 1% (2012) e 2,4% (2013). Para 2014 o Fundo Monetário Internacional projeta um crescimento do PIB brasileira para frustrantes 1,3%. Em 2015 a expectativa do Fundo que era inicialmente de 2,6% foi revista para 2%. Entre os países do Brics (Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul) a projeção de crescimento da economia brasileira só perde para a Rússia, fixada em 0,2%, diz o FMI. Ou seja, corremos o risco de nos próximos anos termos crescimento negativo e isso seria o fundo do poço.
Por último, conforme dissemos, também a subida dos preços é outro fator preocupante na economia brasileira.
O Banco Central do Brasil fixou uma meta anual para a inflação brasileira de 4,5% desde 2005 com banda flutuando entre 2,5% a 6,5%. Esses valores prevalecem até 2016. Entre 2010 e 2013 a inflação anual efetiva medida pelo IPCA foi de, respectivamente, 5,91%; 6,50%; 5,84%; e 5,91%, ou seja, muito acima da meta anual de 4,5%. No final de setembro de 2014 o Banco Central divulgou em seu Relatório Trimestral de Inflação que há expectativa que a subida dos preços alcance 6,3%, isto é, abaixo mas muito próxima do teto máximo. É esperar para ver.
Portanto, diante desses números não há como afirmamos que a economia brasileira vai bem. Não vai. Não adianta tapar o sol com a peneira. Nosso paciente precisa de cuidados. Do contrário, vai para a UTI (e todos nós com ele).
Que nossas autoridades tenham sensibilidade para perceberem isso, colocando as pessoas certas nos locais certos. Que as cores partidárias e os acordos políticos costurados em campanha influenciem minimamente o processe de ajuste. O sistema econômico não reconhece outras leis que não as de mercado.
ALIPIO REIS FIRMO FILHO
Conselheiro Substituto/TCE-AM